segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Meu primeiro vestibular (pra valer).

Acordo as 4 da manhã, como combinado. "Nós só vamos daqui a duas horas" diz minha mãe. Beleza, tomei o susto do despertador sem ter precisado. Levanto uma hora mais tarde, banho, café. Minha prima ficou estudando até tarde, me deu desespero. Jogo o desespero no fundo do baú e durmo no carro.
Seis horas mais tarde, chegamos no Acre. Super cute, tudo arrumadinho. Boas impressões. Como eu sou rato de casa, nenhum hotel é do meu agrado (a não ser que ele seja como aqueles maravilindos de Dubai). Começo a perceber que a minha frescurite vai me causar problemas sérios se eu quiser mesmo ser viajante. Almoçamos em um restaurante em que se precisa subir uma escada horrivelmente íngreme pra entrar. Eu e minha prima fomos à praça do Plácido de Castro, ao lado da biblioteca (que pro meu azar, precisava de cadastro até pra entrada), mas voltamos logo. Dormir, dormir, dormir! 18h, fomos todos ao Canal da Maternidade, comer bolo e cocada (os canibais comeram tacacá). Mega Biblioteca da Floresta, cheia de informações sobre o Chico Mendes (pra variar). Mais de 5 bibliotecas, casas de leituras e filmotecas em Rio Branco. Planos para um planetário. Muita, muita vergonha da minha cidade.
A noite foi tranquila, só acordei uma vez durante a madrugada. Levantei as 6 - por mim levantaria 5h, mas meu pai disse que eu teria merda na cabeça se o fizesse. Mandou que eu parasse de ser desesperada. "Que desespero?" eu disse. Eu ainda não o sentia. Depois do banho da manhã, desci correndo para o café. Vestia minha camiseta do Wolverine. Me sentia bem. O hotel estava cheio de mato-grossenses (as usual, eles estão em todos os lugares) e alguns goianos. Café-da-manhã super reforçado.
Não pegamos trânsito. Deixamos minha prima na UNINORTE e seguimos rumo à UFAC. LO-TA-DO. Muita, muita gente. Fui correndo pro meu bloco, nem tinha tanta gente lá. No caminho conversei com uma acreana, e dei a entender que era de outro estado. "É de Rondônia?" ela perguntou com o mesmo nojo que todo vestibulando de Rondônia fala com os do Mato Grosso. "Sou", respondi na menor voz que já usei em toda a vida. O Wolverine começou a ir embora.
Estava só. Não encontrei ninguém da escola, ou mesmo do estado. Fiquei 30 minutos em pé, olhando para o nada. O caos reinava na universidade: não se entrava na sala com bolsa. Começou a chover. Encontrei Poliana, e ela também mascarava seu nervosismo. Conversamos bastante, até um fiscal me parar e dizer que eu não poderia entrar na sala porque a minha garrafa d'água era verde. Sem lógica isso, mas ok. Deixo do lado de fora. Thamyres vem correndo até nós (Deus, de onde ela surgiu?) e diz que passou a maior raiva da vida. Trouxe bolsa e teve que deixar na cantina. Teve que comprar caneta bic, porque não estavam deixando entrar com canetas com tubinho que não fosse transparente. "O QUE?" eu arregalei os olhos. Duas canetas com o tubo branco, grafite cinza. "Onde cê comprou caneta, Thamyres?", "Na cantina, core lá, te empresto um real." Medo. Desespero real. A chuva pareceu ficar mais forte, o vento mais frio. "Ainda tem caneta, moça?", "Não" ela disse.
Não. Não.Não. Não. Não. Não. Não. Não. Não. Não. Não. Não. Não. Não. Não. Não. Não. Não. Não. Não. Não. Não. Não. Não.
Não eram ecos de "Não". Eram nãos (?) bem definidos, claros - era como se ela estivesse gritando na minha cabeça.
Volto para o meu corredor. Todo mundo está entrando nas salas. O nó na garganta que estava formado há mais de duas horas desatou. Eu me sentia ridícula com a minha droga de camiseta, eu me sentia ridícula por ter passado sono, por ter viajado por seis horas dentro de um carro, por não estar na minha casa. E chorei. Percorri todo o caminho que tinha feito, sentindo desespero, vergonha, fracasso. E ninguém ligava. Era como se eu fosse invisível, a garotinha gordinha, com cara de criança, chorando. Não era como se as pessoas percebessem que eu estava chorando e cagassem pra isso - elas simplesmente não olhavam.
Não achei nenhuma droga de orelhão. Quando estou quase no fim do corredor, encontro Jéssica. Conheci Jéssica oficialmente há duas semanas, na formatura. Ela sempre pareceu ser legal, apesar de ser moreirete e ter opiniões bem diferentes das minhas. "Não pode entrar com essa garrafa, nem com caneta que não seja transparente ou grafite. Eu não vou fazer a prova." Ela me olhou com a maior calma do mundo e disse: "Eu tenho uma. Calma. Respira." Alívio (e ao escrever isso, eu senti as mesmas coisas que senti na hora).
Depois do desespero veio a raiva. Muita. Baixou a Maria-processo em mim, eu só não queria processar Jesus Cristo. "Vai reter minha carteira de identidade também (caralho implícito)?" "Não, não" o fiscal disse.
Terminei a prova 12:30. Só tive que esperar 30 minutos pra sair com o caderno de provas. Segundo gabaritos extra-oficiais, fui mal em matemática (5) e biologia (6). Mas ótimo! 5 em matemática é milagre, e eu nem estudei biologia esse ano mesmo.
Almoço, hotel, Mercado Velho. Comprei bio-jóias pra Thalia, minha host mother do futuro. Restaurante com Thaianne, Bebê, família e amigo do meu pai. Os assuntos rodam, rodam, rodam e morrem em escola. Ou vestibular.
Segundo dia de prova, estava mais tranquila. O tema da redação era opcional, Amazônia ou amizade. Segurei o riso. Umáyra dissertando sobre a "importância da amizade na qualidade de vida". Umáyra que não confia em ninguém com 32 dentes. Nem em sonho. Amazônia era mais seguro. Sentei completamente na castanheira, em física. Não importa. Me forcei a não me importar. Almoçamos e voltamos pra Porto Velho.
6 horas depois, muitos chicletes, salgadinhos e sucos "Tobi", chegamos. Fui direto pra internet, olhar gabaritos extra-oficiais. As questões erradas começaram a aparecer e eu desisti de olhar o resto. Não olharei. Vou esperar sair o resultado. Vou esconder essas provas.
Ainda não sei minha nota de física, tenho química sexta-feira e nem comecei a estudar.
Ai Deus.
Começar tudo de novo.

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