quinta-feira, 29 de outubro de 2020

"Tristeza não tem fim"

 Eu passei os últimos seis dias sofrendo, e mais ainda nos últimos três. Terça-feira eu fiz algo que minha terapeuta recomenda vivamente: eu enfrentei algo de frente. Eu tenho o hábito de fugir, sabe? Eu deixo as coisas passarem, eu deixo a vida passar, deixo o que quer que seja que tenha me magoado passar. Mas terça-feira eu confrontei a situação, e não foi tão horrível. Claro, minha sessão de terapia, que aconteceu 1h depois do ocorrido, foi uma grande merda. Eu passei vinte minutos chorando, tentando racionalizar as coisas, sendo que e o que eu queria de verdade era sumir. Abri uma garrafa de vinho assim que acabou, e bebi inteira. Chorei mais. Montei uma playlist de sofrimento, liguei pra uma amiga, tuitei em caixa alta tudo o que eu estava pensando. Prometi pra mim mesma que só teria esse dia de sofrimento, e depois me enterraria em livros.

É óbvio que nada do que eu planejei deu certo. Desde quando alguém sentimental demais consegue controlar o que sente? 

Hoje digito isso da cama. Ontem eu senti tanta dor no corpo que tive que tomar um miosan. Hoje ainda tenho o pescoço duro, sinto uma dor esquisita do lado direito do peito e um impulso tentador de não comer por cinco dias. Li um pouco, mas passei a maior parte do tempo ouvindo música e chorando, sentindo tristeza, sentindo raiva e vendo Fleabag. Tenho vontade de dizer pra todo mundo que estou triste. "Olha, eu tô triste. Vocês não tão vendo que eu tô triste?". O que recebo dos poucos amigos que perguntam, é um silêncio ensurdecedor, que parece muito com pena. Eu sinto um "todo mundo já passou por isso" em cada palavra de cada um. Um "supera isso logo". Talvez esse seja o malefício de ser alguém que parece muito forte: todo mundo acha que eu sei lidar muito bem com meus sentimentos, e que eu consigo me virar sozinha.

Talvez eu sempre tenha tido que me virar sozinha, porque sempre sinto um pouco de desdém dos outros em relação aos meus sentimentos. Talvez eu tenha ouvido tanto que sou uma grande dramática e exagero em tudo, que acabei internalizado isso, e no fim das contas eu sofro por sofrer demais.

Eu sinto uma raiva imensa por ter cedido, e ter me aberto emocionalmente pra alguém que nunca quis se abrir. Eu fico voltando e voltando pro exato instante que eu cedi e grito "sua burra do caralho, não faz isso!". Eu sinto uma revolta enorme, porque dessa vez não fui eu quem procurou isso: ele veio atrás de mim. Ele insistiu. Se ele insistiu, se ele iniciou, então por que sou eu que estou chorando na cama e me sentindo um lixo? Por que não é ele que está sofrendo? Eu quero que ele sofra. Eu não me importo que ele não fez nada pra me magoar intencionalmente. Ele me magoou, querendo ou não. Por que quem paga por isso sou eu?

Eu me sinto um lixo, porque acho que a culpa é minha. Eu não fui bonita o suficiente. Eu não fui interessante o suficiente. Ele me conheceu o suficiente pra perceber que eu sou uma grande fraude, e eu não sou o suficiente nem pra ele, nem pra ninguém. Eu não sou magra, eu não sou feminina, eu não sou inteligente, articulada, sexualmente experiente. Ele viu que eu sou uma grande fraude, e ele correu. E não teve coragem de dizer nada disso na minha cara, então fez o que todos os outros fizeram: começou a desaparecer aos poucos. Porque como os outros, ele também não me respeita.

Mas hoje eu percebi, que acima de tudo, eu sinto tristeza pela rejeição. Mais uma vez eu fui rejeitada. Eu tentei, e dessa vez não foi nem escolha do meu dedo podre: foi ele que veio até mim, e ele provou, como os outros, e também me rejeitou. Talvez eu sofra desse jeito e nessa intensidade, pra não esquecer como rejeição dói. E depois de um tempo, quase todos os momentos bons se vão; eu lembro de um beijo enquanto eu descia a Augusta, uma conversa na Martins Fontes depois de uma peça de teatro, de andar de mãos dadas na Paulista. São só flashes, encobertos pelo sentimento aterrador da rejeição.

Eu sei que isso vai passar. Mas agora, a única coisa que eu consigo desejar, é que não tivesse acontecido. 

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